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Roma: passeios no Coliseu, jardins papais e bairros turísticos

Nem precisava, claro. Mas a Cidade Eterna está cheia de coisas fresquinhas para fazer. Tem programas até pouco tempo atrás secretos, como os jardins do papa e os subterrâneos do Coliseu.

Por Beatriz Santomauro
Atualizado em 16 dez 2016, 07h45 - Publicado em 8 dez 2014, 12h07

Nem precisava, claro. Mas a Cidade Eterna está cheia de coisas fresquinhas para fazer. Tem programas até pouco tempo atrás secretos,como os jardins do papa e os subterrâneos do Coliseu. Tem passeios por bairros pouco turísticos. Tem um delicioso tour alternativo mostrado no flme A Grande Beleza. ROMA, che te fa benne!

Não que ela precise, claro. Mas Roma, a milenar Roma, está cheia de novas atrações – que vão bem além do riff em torno de João Paulo II e João XXIII, os dois papas pop recém-canonizados. Sempre encantadora, sempre poética, sempre classuda em suas construções de tom ocre, a Cidade eterna agora oferece aos seus turistas embasbacados um punhado de programas que podem ser resumidos assim: maneiras até pouco tempo atrás restritas ou secretas de conhecer cartões-postais milenares. É como se nós, curiosos turistas, de repente virássemos aqueles personagens do livros do Dan Brown, cheios de acessos exclusivos e visões das internas de pontos de visitação históricos. e, claro, bem longe da espera nas bilheterias para comprar ingresso lá do lado de fora.

Para começar, um velho conhecido, o popularíssimo Coliseu. Não, não tem nada de batido aqui. muita gente não sabe, porque a divulgação não foi das melhores, mas desde novembro de 2011 dá para ir além do tour clássico pelas escadarias intermediárias do anfiteatro, depois de enfrentar filas gigantes. Com hora marcada previamente pela internet, dá para explorar os subterrâneos e as áreas mais altas das ruínas – o chamado terceiro anel. Com outra diferença: aqui, um guia fica à disposição dos visitantes durante toda a hora e meia do passeio (há opções em italiano, inglês e espanhol). O tour tradicional, só com um audioguia pago à parte. Participei dessa visita, seguindo a arqueóloga-sabe- tudo elena. Contando a história do anfiteatro construído no século 1 d.C. pelos imperadores Vespasiano e Tito, ela abria e fechava cadeados dos portões no caminho para nós, os privilegiados. Vimos o ponto onde as gaiolas com animais eram içadas para a arena e os corredores subterrâneos pelos quais chegavam os gladiadores que, logo acima, iriam matar ou morrer.

Por ali também passavam os imperadores a caminho da tribuna de honra. Nos dias de espetáculos, podia receber, for free, até 20 mil pessoas sentadas, no frenesi de comemorar uma vitória em batalha ou uma nova conquista. Fique sabendo também que a arena era multiuso – era capaz também de abrigar batalhas de barcos em miniatura, já que a estrutura permitia que todo o subsolo fosse inundado. Depois fomos para a parte alta do Coliseu (o que exige algum preparo físico para vencer as escadarias). a paisagem lá do alto vale todos os suspiros e cliques. Dá pra ver o Coliseu em toda a sua grandeza e ainda levar, de graça, uma panorâmica sem igual dos arredores, como o Fórum imperial, o Fórum de Trajano, o monte Palatino – enfim, todos aqueles cartões-postais dos quais nunca nos cansamos.

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Novas mudanças vêm por aí. Em 2011, Diego Della Valle, presidente e CEO do grupo Tod’s (de sapatos, tecidos e artigos de couro de luxo), assinou um contrato com a prefeitura de Roma para patrocinar a restauração do Coliseu. Desembolsou, para isso, € 25 milhões – um investimento da iniciativa privada inédito na recuperação de monumentos na itália.

Talvez por isso, o barulho foi grande. Apesar de ele jurar que não ia usar a arena para vender sapatos, muita gente ficou desconfiada. e desconfiada foi à Justiça para contestar pontos do contrato, temendo a instalação de placas de propaganda ali. a polêmica atrasou a reforma em dois anos, mas, vencida a peleja na Justiça, a cidade finalmente começou as obras no ano passado.

Nesse começo, já dá para ver resultados: a fachada está sendo limpa e, conforme os tapumes são retirados, o que era preto de fuligem está voltando a ser branquinho-mármore de novo. mais adiante será feita uma mexida estrutural, mas é provável que apenas os nossos filhos vejam a obra finalizada.

Macabro, mas legal

Outro ponto turístico que pode ser visto de ângulo diferente fica no vaticano: a Necrópole da via Triumphalis. trata-se de um cemitério usado entre os séculos 1 a.C e 2 d.C. e que, com o passar do tempo, foi coberto com as novas construções da cidade.

Faz cerca de 60 anos que os pesquisadores exploram a área, mas só em fevereiro deste ano o lugar foi aberto à visitação. “você é uma das primeiras pessoas que veem isso tudo”, valorizou a guia Anna, outra sabe-tudo, ainda no hall de entrada dos museus vaticanos. Formamos nosso grupo e partimos para o tour, esse também de uma hora e meia, caminhando em passarelas sobre os achados arqueológicos.

As pessoas enterradas ali eram na maior parte escravos com grande proximidade com os imperadores ou pessoas da classe média. os estudiosos já identificaram os nomes de mortos em cerca de 250 túmulos catalogados, que se espalham numa área de cerca de mil metros quadrados. No sítio arqueológico, em meio a esqueletos expostos, há mosaicos, afescos, inscrições e jarros que guardavam as cinzas dos corpos cremados. o.k., é meio macabro, mas é bacana. A guia contou ainda que toda a área, séculos atrás, foi usada como estábulo por peregrinos que visitavam a tumba de São Pedro, enterrado na Basílica que leva seu nome, pertinho dali.

O jardim é do povo

Tive sorte: consegui reservar, também pela internet, a recém-inaugurada e já disputada visita aos Jardins do vaticano, em Castel Gandolfo, cidade a 40 minutos de trem de Roma – e mais 25 minutos de caminhada da estação até os portões do jardim, metade disso em uma subida rigorosa. se você estiver de carro, fica mais fácil: dá pra estacionar mais perto da entrada.

Estava um dia lindo com céu azul e brisa na sombra, perfeito para caminhar seguindo outra sabida guia durante (parece combinado) uma hora e meia. a moça parecia um pouco apreensiva por encabeçar apenas o segundo grupo que conseguia fazer o passeio em toda a história daqueles jardins, já que tempestades atormentaram a cidade no início de março. e, quase fazendo o sinal da cruz, disse: “Nós devemos esta visita ao papa Francisco, que neste mês permitiu que esta área fosse aberta ao público”. Amém!

Todo o terreno onde estão os jardins, além de vários prédios no lugar, pertencem à igreja desde o século 17, quando o papa era Urbano VIII, membro da rica família Barberini. Em 1929, quando o estado do vaticano foi criado, Pio Xi começou a dar as feições atuais à área. a partir de 1933, todos os papas usaram o prédio de três andares na propriedade como residência de verão, trocando o abafado de Roma pela brisa do alto da montanha e pela umidade provocada pela proximidade com o lago albano.

Por isso, as árvores seculares têm muito a fofocar. a guia explicou ao grupo que, assim que o agora santo João Paulo II desembarcava de seu helicóptero, fazia questão de rezar em frente à imagem de Nossa Senhora diante do lago de carpas. E que era lá também que o papa Bento XVI dava comida aos peixinhos coloridos. Perto dela, o mesmo Bento XVI adotou uma pequena capela, de formato arredondado, que não era muito valorizada por outros pontífices. gostava de rezar ali. Com a abertura para o público, quem não deve usar as  instalações no verão é o papa Francisco.

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Sorte nossa. os jardins, todos interligados por alamedas, são um arraso: plantas milimetricamente bem cortadas formando desenhos variados, labirintos feitos de plantas e também o brasão do papa atual (embora ainda estejam esculpidas a concha, o mouro e o urso escolhidos como sinal por Bento XVI). Há ambientes que contornam uma única árvore de magnólia, fontes antiquíssimas, esculturas de mármore, caminhos rodeados de pés de alecrim e lavanda e um trecho com várias roseiras.

Entre uma planta e outra, vê-se um anfiteatro, o que restou das piscinas de águas termais, um corredor imenso, de uns 50 metros – ruína da antiga entrada da construção. E mais ruínas – tudo com cerca de 2 mil anos, quando a área já era ocupada pelo imperador Domiciano, o sucessor dos construtores do Coliseu. “Ele ficou conhecido por perseguir os cristãos”, lembra a guia. e os bochichos em volta completam: agora, sobre os escombros de sua riqueza, são os cristãos que reinam na área.

Saindo dos portões do jardim morta de fome, rumei para o centro histórico para almoçar no restaurante Sor Capanna, no Corso Della Repubblica, uma das muitas opções concentradas na rua principal. Depois, sobremesa na vizinha doceria Castello, onde pedi um bignè. redondinho, parece um profiterolo, tem massinha fininha, fita ou assada. Por dentro, um recheio (farto) à base de ovos e leite. É encontrado principalmente no feriado de 19 de março, quando é comemorado o dia de são José. Meraviglioso!

Para finalizar o passeio, fiquei curtindo, do alto da praça principal de Castel Gandolfo, a vista do lago albano. No verão, a cidade fica lotada de gente que se aboleta na prainha que se forma nas margens do lago. Já era a hora de pegar as rampas que levam de volta à estação de trem. Dessa vez, em uns dez minutos relaxantes de descida. 

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