Imagem Blog Achados Adriana Setti escolheu uma ilha no Mediterrâneo como porto seguro, simplificou sua vida para ficar mais “portátil” e está sempre pronta para passar vários meses viajando. Aqui, ela relata suas descobertas e roubadas
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De Santiago a San Pedro de Atacama de carro

A distância parece uma eternidade, mas certamente é daquelas viagens que ficam marcadas na memória

Por Adriana Setti
Atualizado em 24 abr 2018, 19h17 - Publicado em 9 jun 2008, 16h06

O caminho entre Santiago e San Pedro de Atacama, a cereja do bolo da nossa viagem, não é apenas um caminho. É uma das etapas mais gostosas do percurso, para a qual me arrependo de não ter reservado mais tempo (ai… aqueles três dias em Santiago passando calor…). Saindo da capital chilena, é só pegar a estrada Panamericana (que cruza praticamente toda a América do Sul) em direção ao norte. Durante os 440 quilômetros até La Serena, a maior cidade desta região chamada El Norte Chico, a pista é dupla e impecável. É neste trecho, também, que a via passa rente ao litoral, lindíssimo, onde não paramos por falta de tempo. Pena.
De uma lado, o azul marinho (marinho mesmo!) do Pacífico é presença constante, e de outro, zonas verdes dos vales dos rios que descem os Andes alternam-se com outras áreas que avisam que o deserto está chegando. Passando La Serena, no entanto, a pista torna-se única, porém honesta. É hora de mergulhar no meio do nada: a secura total e a ausência de qualquer sinal de vida humana durante quilômetros e quilômetros. Abastecer o carro até La Serena é questão de sobrevivência. Durante este trecho, a idéia macabra da remota possibilidade de um carro quebrado passa na cabeça até mesmo da mais otimista das criaturas. O deserto tem esse poder, o de fazer o ser humano se sentir frágil, pequeno e vulnerável.

Os 830 quilômetros até nosso destino, a Bahia Inglesa, passam voando. Voando tanto, que fomos parados pela seríssima polícia chilena, los pacos, para os íntimos. Mostramos a carteira internacional de habilitação. ¿Que es eso? Ok, mostramos a carteira brasileira de habilitação. Pergunta daqui, pergunta dali.. “Señores, en este caso yo tendría que apreender la documentación, pero...”. Os três segundos entre o pero e a próxima palavra parecem anos. Será possível que um paco vai pedir suborno??? Será que nem o Chile se salva? Será que estamos na roubada do milênio? “Pero para que lleven um buen recuerdo de Chile, que vayan más despacito y buen viaje“. Gente buena o tal do paco!
A placa “Bahia Inglesa 5km” surge em um lugar onde o mar parece estar a quinhentos, e não a cinco, quilômetros de distância. Seguimos pela estradinha e, poucos minutos depois, dá-se o milagre. Uma praia de areia cor de talco surge na extremidade do deserto, e o pacífico abre uma concessão ao azul turquesa. É bom demais pra ser verdade.
A vilazinha da Bahia Inglesa é de sonho. Ultra primitiva, com poucas casinhas de madeira que lembram as californianas e algumas pousadas. O hotel Rocas de Bahia Inglesa é o mais ajeitado. Mas para entrar no clima de verdade, preferi alugar uma cabaña, como a maioria dos freqüentadores da praia. Há plaquinhas por toda a vila. Foi assim que encontrei a Janet (que chamei de Judith do começo ao fim por motivos que a razão desconhece), a pessoa mais fofa do Chile. Esta senhora roliça e sorridente aluga casas e cabañas, tem um mercado, promove eventos e, acredito, muitas coisas mais. Descolamos uma cabañita de três quatros, de frente para o mar, por 50 dólares. Delícia!

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Foi a queridíssima Judith, perdão, Janet, que nos deu A dica: a Playa la Virgen, que fica a vinte quilômetros ao sul da Bahia, acessível por uma estradinha de terra litorânea. Um barranco desce diretamente do deserto, e a areia vai ficando cada vez mais branca e fofa na medida em que a água se aproxima. O mar é cristalino e gelado. Há pouquíssima gente por lá. E o único vestígio de civilização são alguns bangalôs fincados no morro e um restaurante charmosíssimo, onde comi o prato mais gastronomicamente interessante da minha passagem pelo Chile: um chupe de loco (creme feito com o marsico estrela chileno, o loco).
O duro foi a despedida, após somente dois dias. Ao recolher as chaves da casa, nossa anfitriã Janet deu um abraço de urso em cada um de nós. E ficou junto com a sua família na rua acenando até perder-nos de vista. Ai que vontade de chorar…

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