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O melhor restaurante do mundo não é tudo isso

Fiquei pensando se algum comensal daquele salão não estaria “amando” só porque, afinal, fez reserva há quase um ano e pagou uma nota por aquele almoço

Por Fabricio Brasiliense
Atualizado em 17 fev 2021, 18h56 - Publicado em 10 abr 2014, 20h21

Eu me emociono com picadinho e ovo poché, bife de fígado acebolado, pastel de feira, língua com ervilha, então por que não me emocionaria com o melhor restaurante do mundo? Já estava com passagens compradas para a Espanha quando resolvi tentar a sorte mandando um e-mail para o Celler de Can Roca – eleito no ano passado pela revista Restaurant como o melhor do mundo e com reservas disponíveis apenas para março de 2015 –, implorando por uma mesa. Um dia depois me responderam que havia um lugar para o dia 13 de fevereiro às 13 horas; era pegar ou largar. Sempre achei o 13 um número de sorte e lá fui eu para Girona.

Ambiente aconchegante, um jardim envidraçado no meio da construção, os três irmãos Roca estavam presentes e foram muito gentis, garçons idem. Logo que sentei, a carta de vinhos veio à mesa em três tomos que juntos eram mais grossos do que o Novo Testamento. Mas e a comida? A comida foi, nem eu acreditei, uma decepção. “Como assim, é o melhor do mundo?”, é o que me dizem quando eu conto. Até que uma colega que também esteve lá admitiu: “Também não gostei, mas sinto vergonha de dizer”. Alívio, eu não era o louco a dizer que o rei está nu.

Um dos pratos do menu de dez etapas foi um timbal de foie gras e maçã com azeite de baunilha, que eu só consegui engolir depois de um golão de água. A textura e o gosto eram nauseantes. Por um segundo cogitei enrolar o que sobrou nas folhas do bloquinho que eu levava. Mas o que fiz foi cruzar os talheres e abrir um sorriso amarelo pra garçonete, que gentilmente perguntou se eu não tinha gostado. Pois é.  Ela não fez cara de que eu tinha jogado pedra na cruz, ficou tudo bem.

O timbal: só de postar embrulhouTimbal: só de postar embrulhou

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Muitos pratos continham trufas; taí um ingrediente com que toda parcimônia é pouca. Faço justiça às sobremesas de Jordi Roca, principalmente ao Postre láctico, releitura do Romeu e Julieta, divino.

postre lácticoPostre láctico: doce de leite, goiabada, sorvete de leite de ovelha, espuma de coalhada de ovelha, iogurte de ovelha e nuvem de chantilly (de ovelha, claro)

narizO nariz de Jordi Roca em formato de picolé

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Faço minha aposta de que no próximo dia 26 de abril o Celler vai ganhar como o melhor do mundo por ser uma tradição da Restaurant premiar por no mínimo três anos consecutivos o mesmo restaurante. Acredito que o Celler agrade a muitos e que não ter gostado pode ter sido um problema apenas meu. Mas naquela tarde de fevereiro, olhando as pessoas sentadas ao meu redor, fiquei pensando se algum comensal daquele salão não estaria “amando” só porque, afinal, fez reserva há quase um ano, cruzou um oceano para chegar lá e pagou pelo menos R$ 500 pelo menu mais barato.

Antes de ir embora, a garçonete me contou que todos os funcionários do Celler almoçam e jantam no restaurante da mãe dos irmãos Rocca, que fica na quadra de cima. O lugar chama Can Roca, cobra € 12 pelo menu e não é preciso reservar. Seguramente será o meu destino da próxima vez que eu for a Girona.

A fachada do Can Roca, restaurante da mãe dos irmãos Roca que fica na rua de cimaA fachada do Can Roca, restaurante da mãe dos irmãos Roca.

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